Projeto prevê pena de detenção para revista íntima
O projeto de lei nº 583/2007 de autoria da deputada Alice Portugal (PCdoB-BA) proíbe a revista íntima de mulheres nos locais de trabalho, incluídas as empresas privadas, os órgãos públicos da administração direta e indireta, as sociedades de economia mista, as autarquias e as fundações em atividades no Brasil.
No artigo 2º é estipulada multa de 50 salários mínimos para o infrator, a suspensão, por 30 dias, do funcionário da empresa que procedeu à revista, em caso de reincidência e, ainda, incorrendo em nova reincidência, o empregador ficará sujeito à detenção de seis meses a um ano.
De acordo com a deputada, apesar do avanço alcançado pelas mulheres brasileiras no reconhecimento dos seus direitos, permitindo que grande parte das reivindicações esteja representada na atual Constituição Federal, a igualdade garantida na Lei ainda é desrespeitada muitas vezes no cotidiano delas, como o grande número de trabalhadoras que são constrangidas a se submeterem diariamente à prática da revista íntima, em total desrespeito ao artigo 5º, inciso X que estabelece serem invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas.
O objetivo do projeto, segundo Alice Portugal "é garantir e assegurar à mulher o direito ao trabalho sem ter, sucessivamente, sua intimidade violada". Entre os vários parlamentares que apoiaram sua iniciativa, está a deputada Teresa Surita (PMDB-RR), para quem "os efeitos dessa prática nas mulheres são devastadores".
A doutrina e a jurisprudência brasileira consideram a revista pessoal - tanto a realizada diretamente no corpo do empregado como a feita em objetos como bolsas e sacolas - uma forma de concretização do poder de controle do empregador. Mas para a procuradora Sandra Lia, o "entendimento até hoje dominante a respeito da revista não surgiu de um correto juízo de ponderação, posto que se protegeu apenas o direito de propriedade em detrimento do direito à intimidade e à vida privada".
A revista em objetos
Além da revista íntima, os trabalhadores estão sujeitos à revista de objetos como bolsas, sacolas, papéis, carros, armários, escrivaninhas e mesas, geralmente toleradas pela jurisprudência, não ensejando, na maioria dos casos, indenização por dano moral.
Todavia, muitos trabalhadores se sentem constrangidos com essa forma de revista, por entenderem violadas sua intimidade e privacidade, especialmente quando ela é rotineira e por essa razão, ingressam com ação na Justiça do Trabalho buscando indenização por danos morais.
Para o ministro corregedor-geral da Justiça do Trabalho, Barros Levenhagen, a revista realizada com moderação e razoabilidade não caracteriza abuso de direito ou ato ilícito, constituindo, na realidade exercício regular do direito do empregador ao seu poder diretivo de fiscalização.
"Mas no momento em que o vistoriador avança e passa a fazer contato corporal com o empregado, a pretexto de estar vistoriando a bolsa, ele já passa a incorrer no ato faltoso da revista íntima", ressalta. Por isso, explica o ministro, se penaliza o empregador, por causa da quebra do princípio da inviolabilidade da privacidade do empregado.
Revista em hipermercado
São inúmeros os julgados do TST nesse sentido. Um exemplo é a ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho da 5ª Região por dano moral coletivo contra a Companhia Brasileira de Distribuição, Grupo Pão de Açúcar, pelo fato desta ter realizado revista visual em bolsas e sacolas dos empregados.
Embora a sentença de Primeiro Grau tenha sido favorável ao MPT com a condenação da empresa ao pagamento de R$ 100 mil por dano moral coletivo e multa de R$ 5 mil por trabalhador prejudicado, a empresa conseguiu revertê-la no TST. Ao julgar ação rescisória do Pão de Açúcar, a Subseção 2 Especializada em Dissídios Individuais (SDI2) do Tribunal acompanhou o voto do ministro Ives Gandra Martins, relator do processo, que deu provimento ao recurso da empresa (em juízo rescisório) e julgou improcedentes os pedidos formulados pelo MPT.
Para o relator condenar a empresa por dano moral, por eventual lesão causada ao empregado "somente faz sentido quando se verifica a repercussão do ato praticado pelo empregador na imagem, honra, intimidade e vida privada do indivíduo". Mas o ministro considerou inexistente o abuso de direito e a ocorrência de excessos ou atos discriminatórios pela empresa, elementos, que a seu ver, ensejariam o dano moral em virtude do sofrimento e da humilhação do empregado.
A revista em bolsas e sacolas dos funcionários, sem ocorrência de contato físico, mas apenas visual de quem a realizou e de forma generalizada, não gera direito à indenização por dano moral, concluiu o ministro Ives Gandra em seu voto.
Empresa de varejo
Em outra ação que chegou ao TST, uma empregada, que exerceu a função de crediarista na rede de varejo Irmãos Muffato & Cia Ltda, postulou indenização por danos morais no valor de 100 salários mínimos, por ter diariamente sua bolsa revistada. Segundo afirmou na inicial da reclamação trabalhista, as revistas de bolsas, carteiras e sacolas aconteciam todos os dias na saída da portaria e eram realizadas pela segurança da empresa.
Para a crediarista, eram discriminatórias, uma vez que os gerentes não eram submetidos a elas, sem contar o fato de serem desnecessárias, pois a empresa tinha meios mais seguros e apropriados de proteger seu patrimônio como as câmeras e alarmes sinalizadores ali instalados.
Mas seu pedido foi rejeitado. Verificou-se para o juiz da Quarta Vara do Trabalho de Londrina (PR) que a revista era feita sem contato físico, além de não ter sido provado excesso de qualquer espécie ou mesmo que a funcionária tenha sofrido qualquer dano de ordem moral durante as revistas. O magistrado destacou ainda, que a mera realização de revista, como o objetivo de prevenir furtos "compreende-se no exercício legítimo e regular dos direitos potestativos do empregador, a fim de garantir a proteção ao patrimônio, não violando qualquer direito do autor".
A autora recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho do Paraná (9ª Região), o qual reformou a sentença e condenou a Muffato a pagar-lhe indenização por danos morais no valor de R$ 25 mil.
A empresa buscou a reforma de decisão junto ao TST alegando a inexistência de revista íntima, mas apenas em bolsas e de forma visual. A Quinta Turma, por unanimidade, acompanhou o relator, ministro Brito Pereira, que deu provimento ao recurso da empresa, para excluir a condenação arbitrada pelo Regional.
É certo que o artigo 5º, inciso X, da Constituição da República, assegura o direito à indenização por dano material ou moral decorrente da violação do direito à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem das pessoas, lembrou o ministro Brito Pereira. Contudo, para ele, diante dos fatos registrados pelo Regional, como o de a revista ser efetuada em bolsas, sacolas ou mochilas da autora, sem contato físico ou revista íntima, "não teve caráter ilícito e não resultou, por si só, em violação à intimidade e à honra da recorrida, a ponto de configurar dano moral gerador do dever de indenizar".
Valor material X imaterial
De acordo com o corregedor-geral da Justiça do Trabalho, ministro Barros Levenhagen, o TST não é contrário ao poder de o empregador realizar a revista, "mas se preocupa em que ela ocorra de forma moderada e observando os princípios constitucionais de inviolabilidade da privacidade da pessoa humana consagrados na Constituição".
Para o ministro, o empregador não pode se exceder nos atos de coordenação e fiscalização do trabalho, submetendo o empregado a uma revista vexatória, caso contrário incorre em dano moral. A entrevista completa com o corregedor, você confere daqui a pouco aqui no site do TST.
Fonte: TST (2.12.2012)